Ilíada, de Homero

Ilíada

Ilíada conta os 51 dias da ira de Aquiles, que ocorreu durante o 9° ano desta guerra, onde embora os personagens fossem inventados, a história era tida como um relato de seus ancestrais, que ocorreu entre os Aqueus (aliança dos estados gregos) e os Troianos ¹.

A Guerra começou com o rapto de Helena, mas a história da Ilíada traz em paralelo a vingança pessoal de Aquiles, que é o modelo de honra e valor para os gregos ¹. 

A raiva é um tema bem presente nessa obra, seja por parte de Menelau e Agamenon por causa do rapto de Helena ou por Aquiles, que se sente injustiçado ao perder Briseida (mulher que ele tinha ganhando como prêmio de guerra e muito a estimava). Essa ira de Aquiles faz com que ele não se curve diante das regalias prometidas, voltando à guerra somente após a morte do amigo, com o intuito de vingá-la, mostra-se aqui a moral do herói, tanto difundida na educação básica da Grécia Antiga ¹. 

Enquanto Aquiles demonstra seu senso de justiça ao vingar a morte de Pátroclo, Heitor é a personificação da lealdade para com a sua pátria e sua família, pois defende o irmão mesmo ele tendo raptado Helena. Ou seja, enquanto um busca a Honra, o outro a Lealdade. Mesmo com traços tão distintos e tão heróicos, ambos possuem suas qualidades e defeitos, não sobrepondo-se um ao outro durante toda a narrativa, pois ambos morrem (Aquiles mata Heitor para vingar Pátroclo e Aquiles é morto com uma flechada em seu calcanhar) e fica a deixa para a honra em lutar na guerra ¹. 

Mesmo diante da barbárie da morte de Heitor, após algum tempo, uma trégua se estabelece quando Príamo pede a Aquiles o corpo do filho para que ele pudesse fazer a cerimônia funerária adequada, o herói, comovido, entrega o corpo ao rei de Tróia . 

Na Ilíada, a questão do herói é ressaltada, como a principal virtude de Aquiles que abre mão de sua ira particular para vingar a morte do amigo. O final da Ilíada não é o final da guerra, mas demonstra a vitória do herói sobre ele mesmo ao devolver o corpo de Heitor à família².

Essa foi uma das leituras mais difíceis que já fiz, principalmente por causa da edição em que comecei a leitura. Para quem não sabe, ao ler uma epopeia, você pode escolher entre uma que prime pelo ritmo ou pelo sentido mais próximo possível, se você pegar uma tradução que prioriza o ritmo, a leitura se torna mais demorada porque parece que não está fazendo muito sentido, rs.

Em vários momentos as atitudes de Aquiles são de um garoto birrento e mimado, o que me distanciou bastante do protagonista de Ilíada, mas de forma geral, foi bacana acompanhar a construção de arquétipos para personagens que são usados até hoje.

Você já se aventurou nessa história?

Referências

1- CANTON, J. O livro da Literatura. São Paulo: Globo, 2016.

2 – CARPEAUX, O.M. História da Literatura ocidental. Rio de Janeiro: Leya, 2019.

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A questão Homérica

“Homero é o maior dos poetas”¹, essas são as palavras de Carpeaux para descrever o autor das epopeias Ilíada e Odisseia.

As epopeias homéricas eram um cânone para os gregos, eles não as liam como nós as lemos hoje, ou seja, como meras obras literárias. Esses dois livros eram os guias da civilização, decorados nas escolas como um código moral e até mesmo como uma bíblia.

Ambas as obras tratam das relações humanas mais profundas e têm os deuses como contrastes da dureza da vida. Por debater questões morais, a exemplo de Aquiles que resolve voltar pra guerra para vingar a morte do amigo Pátroclo; ou Heitor, que é a própria personificação de Lealdade. Ao final, ética discutida nas obras se diferencia, uma vez que a Ilíada2 se atém a ética heroica e a Odisseia3, a ética familiar.

Epopeia: o que é, características, autores, exemplos - Brasil Escola

Historicamente, não foi possível confirmar que o relatado nas duas epopeias realmente aconteceu, sabe-se que a Ilíada deve ter se passado na época feudal da Grécia, enquanto que a Odisseia, na época fenícia da civilização mediterrânea (não à toa tem um barquinho na capa).

A questão Homérica entra justamente aqui, devido às narrativas e aos estilos tão distintos, começaram a surgir algumas hipóteses, como: Homero teria apenas recolhido as histórias contadas e escrito de maneira compilada? Teria Homero de fato existido ou essas obras foram escritas por vários autores?

A grandiosidade de Homero influenciou fortemente diversos aspectos da sociedade grega, sobreviveu até hoje e ainda intriga aos estudiosos sobre a sua origem.

Referências
1- CARPEAUX, O.M. História da Literatura ocidental. Rio de Janeiro: Leya, 2019, p.19.
2- HOMERO. Ilíada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
3- HOMERO. Odisseia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.

Homero, uma breve introdução

Antes de falar sobre Ilíada e Odisseia separadamente, sinto a necessidade de contextualizar um pouco essas obras.

A estrutura

A epopeia é uma narrativa em forma de poema que conta a saga de um herói para ajudar a difundir ensinamentos para a sociedade, principalmente de cunho moral. É uma das primeiras formas escritas de contar uma história que, antes disso, eram passadas ao longo das gerações pela oralidade e justamente por isso que são em forma de poema, pois o verso é bem mais fácil de decorar do que a prosa. Ilíada e Odisseia estão inseridas na lista de primeiras obras escritas que se tem notícia e se enquadram como epopeias.

Homero trabalha, mais especificamente, com a métrica chamada de hexâmetro dactílico, que são versos com 6 unidades rítmicas (uma sílaba longa e 2 sílabas curtas). Essa informação é muito importante na hora de escolher a tradução da Epopeia que você quer ler, pois ela pode primar pelo ritmo e melodia ou pelo conteúdo e puxar mais para a prosa e perder o teor poético (geralmente esta segunda é mais fácil de ler).

A questão Homérica

Os núcleos narrativos de Ilíada e Odisseia são, respectivamente, a ira de Aquiles durante 51 dias do 9° ano da guerra de Troia e o retorno de Odisseu após essa guerra. Mesmo que dê a entender que esses dois livros são uma espécie de continuação, muito neles são destoantes.

Homero – Wikipédia, a enciclopédia livre
Representação de Homero feita no período helenístico. Hoje essa peça se encontra no Museu Britânico.

Ilíada se passa no recorte feudal da Grécia e trabalha com a moralidade heroica dos guerreiros, o exemplo mais vívido que posso citar é a ira de Aquiles para vingar a morte de Patroclo. Enquanto a Odisseia está mais ligada ao período fenício, que é claramente percebido pela quase interminável viagem de Odisseu e suas aventuras marítimas, abordando mais questões éticas em ambiente familiar.

A escrita em si também é bem distinta, enquanto em Ilíada a história parece dura e difícil de caminhar, Odisseia é bem mais fluida e envolvente. Essas disparidades já geraram bastante questionamentos sobre a autenticidade da autoria de Homero, pois mais parece que pessoas distintas escreveram essas histórias, chegando a indagações como: teria Homero apenas reunido várias histórias e as compilado ou seria um pseudônimo de vários autores? Homero realmente existiu?

A importância de Homero na Sociedade Grega

As epopeias homéricas eram usadas nas escolas gregas como material didático e os alunos tinham que decorá-las. Os trabalhos de Homero eram mais do que um material escolar, chegando a serem vistos como um código de conduta desde teses filosóficas à sentenças jurídicas. “Cânone estético e religioso, pedagógico e político; uma realidade completa, mas não imediato de uma realidade” (CARPEAUX, 2008, p. 52).

Conclusão

Percebe-se que a importância de Homero transcende a sociedade grega e perdura na contemporaneidade. A estrutura da jornada do herói que teve início aqui, influencia produções culturais ao longo de várias gerações.

Nos próximos posts falarei sobre Ilíada e Odisseia separadamente.

Referências

CARPEAUX, O.M. História da Literatura ocidental. Rio de Janeiro: Leya, 2019. (GoodReads | Amazon)

HOMERO. Ilíada. 25° ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. (GoodReads | Amazon)

HOMERO. Odisseia. 25° ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. (GoodReads | Amazon)

Estudo perene | Agenda 2021

O cronograma de leitura do Estudo perene para 2021 já está disponível na página do projeto.

Tomando como base o primeiro volume da coleção de Otto Maria Carpeaux sobre a Literatura Ocidental, que se chama “A literatura Greco – Latina: dos gregos e romanos ao primeiro século do cristianismo”.

Sem a pretensão de esgotar todas as obras mencionadas por Carpeaux e apenas a título de representação, assim estão dispostas as leituras:

  • Março: Ilíada, de Homero
  • Abril: Odisseia, de Homero
  • Maio: O melhor do teatro grego (edição Zahar)
  • Junho: Eurípedes (Alceste, Electra e Hipólito)
  • Julho: Eneida, de Virgílio
  • Agosto: Amores, de Ovídio
  • Setembro: Sobre a ira e Sobre a tranquilidade, de Sêneca
  • Outubro: Sobre o ócio, Sobre a brevidade da vida e Sobre a firmeza do sábio, de Sêneca
  • Novembro: A arte de viver, de Epicteto
  • Dezembro: Confissões, de Santo Agostinho

A vida intelectual | Cap. 1 – A vocação intelectual

Obra publicada originalmente em 1921 por Antonin-Dalmace Sertillanges (1863-1948) e revista pelo autor nos anos de 1934 e 1944, tem como principal inspiração os trabalhos de São Tomás, em especial o ‘dezesseis preceitos para adquirir o tesouro da ciência‘.

Declaradamente tomista e escrito por um padre, ‘A vida intelectual’ possui um fundo religioso que pode incomodar aos não teístas. O autor propõe-se a orientar o espírito intelectual cristão para uma vida de estudos.

O primeiro capítulo é titulado ‘A vocação intelectual’ e possui três divisões, a saber: O intelectual é um consagrado, O intelectual não é um isolado e O intelectual pertence a seu tempo.

No primeiro tópico, O intelectual é um consagrado, Sertillanges (2019) aponta a vida intelectual como uma vocação que exige penetração e esforço metódico, é interessante o uso do termo vocação, pois não estamos lidando com um trabalho que pode ser feito por qualquer um, uma vez que deve ser a dedicação de uma vida, “A vida de estudos é austera e impõe pesadas obrigações. […] requer uma dedicação que poucos são capazes.” (SERTILLANGES, 2019, p.27)

Para tanto, claro, é necessário que quem resolveu se dedicar à vida intelectual tenha o estudo como a sua recompensa espiritual, aquilo que lhe dá um verdadeiro prazer, que não o faz por obrigação ou com impaciência.

A busca pela verdade é um dos pilares para o desenvolvimento da vida intelectual, deve-se amar buscá-la, ainda mais quando se é um consagrado. A consagração do tempo e do coração faz parte dessa dedicação, pois somente com o investimento do tempo e com a diligência é que se terá uma real busca e consentimento pela verdade.

Ao evocar a figura do intelectual no imaginário popular, logo pensamos na pessoa que só estuda e não faz mais nada, mas o autor deixa claro que se você tem apenas 2 horas por dia e as dedica com afinco à vocação, mesmo que lento, o progresso se apresentará. Sertillanges, inclusive, aponta a importância de se manter um ofício e de como as parcas horas ganham outro significado, pois exigem ainda mais comprometimento e dedicação, afirmando ainda:

“O que vale mais do que tudo é o querer, um querer profundo: querer ser alguém, chegar a algum lugar; ser já, pelo desejo, esse alguém qualificado por seu ideal.” (SERTILLANGES, 2019, p.31)

Essa motivação na busca pela verdade mesmo nas horas e recursos financeiros limitados me lembrou bastante o personagem Jude, de Thomas Hardy, que mesmo em condições precárias para sobreviver, ele não deixa de contar as moedas para comprar suas gramáticas de Latim e de Grego, estudando até mesmo no fundo da carroça que usava para trabalhar (HARDY, 2019).

Para além dessa dedicação diária aos estudos, o autor menciona a importância de buscar a Deus diariamente em seu tempo de estudo. Kempis (2019), demonstra que não adianta estudar e conhecer a ciência se não buscar a humildade semelhante a de Jesus, pois a soberba corrompe ao ansiar por aplausos e por reconhecimento como resultado de seu esforço, somente a vida santa aos pé de Deus é que pode preencher o coração do homem.

No tópico seguinte, O intelectual não é um isolado, o autor diferencia a Solidão do Isolamento, pois a Solidão é composta daquele momento de meditação, de dedicação à mente e ao espírito, enquanto que o Isolamento é uma mesquinharia que deforma a personalidade.

Mesmo que haja a necessidade de manter a solidão para o auto desenvolvimento, cair nas armadilhas do isolamento é um risco. A interação social faz parte da vida do intelectual, mas não em demasia e não sem necessidade, pois é o contato com o mundo que tornará possível aplicar e conjecturar os temas estudados nos momentos solitários.

A terceira parte do primeiro capítulo, O intelectual pertence a seu tempo, ressalta a importância de identificar o seu gênero de estudo o quanto antes para iniciar imediatamente o seu tempo de dedicação. Fazer essa delineação é essencial para evitar a desgovernança a que estamos sujeitos.

Pode-se perceber que nesse primeiro capítulo, Sertillagens faz o alicerce da vida intelectual, mostrando, principalmente, que ela se faz por meio da vocação. A busca pela verdade é o Norte e o caminho a seguir é traçado com base em sua escolha de estudo, os recursos são a dedicação e o amor por essa incessante jornada.

Referências

HARDY, Thomas. Jude, o obscuro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

KEMPIS, Tomás de. Imitação de Cristo. São Paulo: Principis, 2019.

SERTILLANGES, Antonin-Dalmace. A vida intelectual: seu espírito, suas condições, seus métodos. São Paulo: Kírion, 2019.